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Covid-19 no Dia Mundial da Saúde

7 de abril: Dia Mundial da Saúde!. É momento para refletirmos sobre a Covid-19, a maior pandemia da história recente. Convidamos o coordenador executivo do CEAP, Valdevir Both para falar sobre os aspectos  econômicos, sociais, sanitários e os grandes desafios para o próximo período frente à pandemia.

CEAP – O mês de abril é considerado como o mês da saúde, sendo o dia 7 o Dia Mundial da Saúde. Estamos vivenciando uma pandemia mundial. Na sua opinião, quais as reflexões mais relevantes que precisamos fazer em relação à importância da saúde pública e do SUS especialmente neste momento?

Valdevir – Encerrado o primeiro trimestre de 2021 chegamos a quase 3 milhões de mortes no mundo e mais de 320 mil no Brasil. Mas isso não são apenas números. Por trás dos dados há vidas. É momento de recolocarmos grandes questões e repensarmos nossa organização societal. A primeira reflexão é que epidemias não são coisas do passado. Pelo contrário, elas são eventos que acontecem na história e, especialmente em tempos em que temos tamanha agressão ao meio ambiente, ao nosso ecossistema, elas têm crescido. O número de epidemias  só do sec. XXI tem assustado cientistas da área e deverá urgentemente sensibilizar a comunidade internacional, ou seja,  se as epidemias/pandemias são eventos que podem ocorrer, é preciso estar preparado para envidar todos os esforços para preveni-las e combatê-las quando surgirem.

O que não deixa de provocar profundo desassossego  é perceber o quanto estamos distantes de uma solidariedade  entre países e povos, especialmente por parte de muitos governos, especialmente dos países mais ricos, que deveriam ter uma ação mais intensa no combate à pandemia e consequente proteção das pessoas. Aliás, é em tempos de pandemia que se explicita, muitas vezes, por ação ou omissão, a intencionalidade primeira de muitos governos que é garantir o funcionamento da  ‘maquinaria capitalista’ ao invés da proteção da vida das  pessoas.

“Governos que não protegeram as pessoas tiveram milhares de mortes e, além de perder vidas, ainda produziram um caos econômico”.

CEAP –  A questão econômica é uma preocupação urgente no Brasil. O senhor acredita que a ampla vacinação é o tema central também para garantir o retorno do funcionamento do setor econômico?

Valdevir – Os governos têm a função primeira de garantir a saúde e a vida como direitos mais fundamentais.  O problema é que no Brasil, o atual governo Bolsonaro, para quem a ditadura militar de 1964 serve de inspiração, coloca o interesse do capital, especialmente financeiro e do agronegócio – que lhe dão sustentação – em primeiro lugar ao invés de responder às demandas coletivas da sociedade. É o que provam os números. Segundo a Revista Forbes, Joseph Safra, falecido no final de 2020, aumentou sua fortuna em 30 bilhões de reais num período de 12 meses. Ainda, segundo a mesma Revista, em 4 meses, de março a julho, 42 bilionários brasileiros aumentaram sua fortuna em U$ 34 bilhões (R$ quase 200 bilhões). Façamos as contas: esse valor seria suficiente para pagarmos o Bolsa Família por um período de seis anos ou, ainda, para a nova rodada do auxílio emergencial em 2021, com previsão de 44 bilhões de reais e que beneficiariam milhões de pessoas no país.  Num país que aumentou seu números de pobres de 9,5 milhões para 27 milhões, no período de agosto de 2020 a fevereiro de 2021, conforme dados recentes da Fundação Getúlio Vargas,  isso deveria ser um escândalo nacional e gerar uma insurreição popular. Ao mesmo tempo em que os ricos ficam mais ricos, inclusive em tempos de pandemia, o governo Bolsonaro, através do ministro Paulo Guedes, tem reiterado a necessidade de toda a sociedade fazer esforços para intensificar o ajuste fiscal e frenar os gastos públicos. O que, no entanto, esses números mostram é que esse esforço é desconhecido para esses setores, especialmente o capital financeiro.

No Brasil, especialmente por ação e/ou omissão do governo federal, que não adota ações consistentes de proteção coletiva, as pessoas são levadas a não acreditar na eficiência das medidas de higiene, da vacina ou do isolamento social. Medidas como o lockdown, tão necessárias nesse momento difícil, se transformaram numa palavra quase proibida de ser pronunciada. No entanto, o que se sabe hoje, depois de mais de um ano de pandemia, é que os governos que cuidaram da vida das pessoas criaram as condições mais favoráveis para a retomada econômica, inclusive com  crescimento econômico. A China é um exemplo, sua economia cresceu mais de 2% em 2020 e foi por lá que vimos a adoção de medidas enérgicas de isolamentos e lockdown. No Brasil, onde Bolsonaro e Paulo Guedes insistem que nada deve ser feito nessa direção, o PIB decresceu 4,1%. Os dados mostram que os governos que não protegeram as pessoas tiveram milhares de mortes e, além de perder vidas ainda produziram um caos econômico.

A decadência da economia se mostra pelo número de desempregados: segundo o IBGE, são mais de 14 milhões e mais de 5 milhões de desalentados,  que sequer foram procurar emprego no último período. Coadunado à uma economia que padece, o auxílio emergencial ficou muito abaixo da necessidade da população, especialmente para quem perdeu o emprego, é um valor muito abaixo do necessário para sequer comer, quanto mais para viver com um mínimo de dignidade. Deve ser papel de todos cobrar um valor maior de auxílio emergencial.

CEAP – O que pode ser feito para que a sociedade conheça mais o trabalho e saiba de que forma acionar os conselhos de saúde como forma de garantia de direitos?

Há muitos desafios para os movimentos sociais, conselhos de saúde e para a sociedade em geral. O primeiro deles é uma exigência com mais força para avançarmos na vacinação para todos, não há outro caminho. Até não atingirmos uma vacinação acima de 70% vamos precisar de medidas de proteção, nas quais estão incluídas as medidas de isolamento. Se você empresário quer abrir o comércio o mais rápido possível ajude a pressionar o Governo Bolsonaro pela vacinação em massa, cobre que haja mais rapidez no processo de vacinação.

É urgente e necessário também colocar em debate na sociedade o fortalecimento do SUS. Sem o SUS talvez teríamos o dobro de mortes e de infectados no Brasil. Mesmo que o Sistema Único de Saúde tenha tido um conjunto de desconstruções nos últimos períodos – como a Emenda Constitucional 95, aprovada pelo Congresso Nacional em 2016, os investimentos em saúde e educação ficaram congelados até 2036 como medida de ajuste fiscal – mesmo com decréscimo de dinheiro o SUS conseguiu e consegue dar resposta consistente às necessidades das pessoas.

Fortalecer o SUS significa, entre outros, denunciarmos o Orçamento Federal aprovada a poucos dias. A proposta aprovada pelo Congresso Nacional tirou do SUS R$ 20 bilhões para 2021 se comparado ao orçamento de 2020.  Por essas e outras razões nós precisamos reafirmar nossa luta para fortalecer o SUS, cobrar mais recursos para a saúde pública como elemento fundamental.

Segue também como grande desafio  o fortalecimento cada vez maior dos Conselhos de Saúde e da participação social, que têm e terão um papel fundamental no próximo período. Os milhares de conselheiros de saúde do Brasil têm o papel de resistir a esta desconstrução e devem ser manter vigilantes no sentido de fiscalizar os governos e propor políticas públicas que ajudem o país a fazer a travessia da Covid-19.

CEAP – Qual o papel que as instituições como o CEAP para o fortalecimento dos conselhos de saúde e a propagação de seu trabalho?

O CEAP tem proposto várias frentes e ações que  objetivam apoiar os movimentos e entidades sociais populares nas suas lutas pelos direitos, especialmente pelo direito humano à saúde e o SUS. Nessa esteira a formação de lideranças e conselheiros de saúde, em conjunto com o Conselho Nacional de Saúde e vários movimentos sociais têm sido fundamentais nos últimos anos.

Para o CEAP a formação, junto à várias outras iniciativas, é fundamental para que efetivamente se faça esta travessia. Aliás, a formação contribui decisivamente para encontramos caminhos possíveis em tempos tão difíceis. E esses caminhos não estão prontos, traçados, devem ser construídos. Para isso, a experiência é fundamental. Se atentarmos há alternativas sendo geradas. São novas formas organizativas e de resolver necessidades fundamentais da vida. A solidariedade humana também se “reinventa” nesses tempos e gera iniciativas importantes. Se por um lado temos um sistema societal capitalista neoliberal aprofunda a desigualdade e a injustiça, de outro lado temos iniciativas solidárias sendo geradas que nos motivam a continuar lutando.

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